23.6.10

Cá com meus botões

Sempre gostei de apertar botões. Deve ser por isso, não vejo vantagem na tecnologia touch screen, que engordura telas e me tira o estranho prazer de sentir o dedo afundando na tecla – como agora.

Quando era pequena, pedia para minha mãe me deixar discar o número dos telefones naqueles aparelhos antigos com disco, que giravam e faziam um barulho engraçado, tectectec, conforme a opção numérica. Também queria que meu pai me levantasse na altura do orelhão, para alcançar os botões e colocar a ficha. Nunca soube para que serviam * e # nos telefones, porque eles nunca eram solicitados nos números e quando eu os apertava, nada acontecia.

Gostava de apertar qualquer coisa: campainha, elevador, console de videogame, caixa eletrônico, até o botãozinho que zera a quilometragem do carro. Um dia, eu o pressionei sem desconfiar qual era a sua função. Depois da bronca que tomei do meu avô, entendi que apertar botões não se tratava de uma ação inconsequente.

Às vezes, minha mãe me levava para o trabalho e a melhor distração que eu podia ter, além de ficar carimbando folhas de papel e preenchendo meu nome em circulares escolares, era datilografar. Tenho paixão por máquinas de escrever desde então. Antes de descobrir aquele chorinho tocado pelo Altamiro Carrilho, o som delas já era música para mim.

Tudo bem que na época, recém-alfabetizada, eu não conseguia ir muito longe. Mas me encantava ver o meu pensamento tomando forma, depois que a tecla descolava da fita, marcando o papel. Eu, que estava me acostumando a segurar a caneta, via minhas ideias surgirem na folha em branco, com uma letra que não era a minha.

A brincadeira perdia um pouco a graça quando eu errava – a digitação ou a palavra – e não conseguia corrigir, nem batendo a tecla correta por cima, com mais força. Era difícil a vida sem o backspace. Em todo caso, rosqueava outra folha e recomeçava, até enjoar. Minha frustração foi nunca ter podido mexer nas máquinas de datilografar elétricas, sempre protegidas com uma capinha, desligadas, inacessíveis

Nessa fase, eu não sabia bem com o que gostaria de trabalhar (até hoje não sei), mas queria fazer algo que exigisse apertar muitos botões ao mesmo tempo. Eu confesso, pensava em ser caixa de supermercado, apenas para operar a máquina registradora, que não contava com leitores óticos de códigos de barras e era toda manual. Eu ficava vidrada na rapidez das moças ao registrar os produtos. As mãos dançando sobre o teclado, dedos que passavam uns entre os outros, sem que elas precisassem olhar para baixo.

Quando tive acesso aos primeiros computadores, quis ser secretária ou recepcionista. O que me interessava era fazer várias coisas ao mesmo tempo, atender ao telefone, teclar, conversar com os clientes. Como jornalista, às vezes me sinto uma secretária: pendurada na linha fazendo entrevistas, sentada diante do computador o dia todo, respondendo a pedidos de textos encomendados.

Quando o trabalho flui, é uma beleza. O problema é ficar olhando a tela em branco, com as mãos pousadas sobre o teclado e nenhum motivo para apertar um botãozinho sequer.


9.6.10

O que quer dizer diz

Quem "não tem palavras para dizer" alguma coisa é porque não tem nada a dizer. Quem quer dizer algo encontra palavras.